Da série: ser fanboy é… (1)

abril 19, 2009

Ser fanboy é escrever um artigo num site de quadrinhos e, após um surto de estrelismo nerd só porque meia dúzia de pessoas discutiam o tema nos próximos dias, levar na cara:

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Daqui.


Super-heróis por Alan Moore

abril 18, 2009

Em recente entrevista à proto-nérdica Wired, Alan Moore DEU A REAL sobre esse lance de super-heróis:

It has occurred to me that the superhero really only originates in America. That seems to be the only country that has produced this phenomenon. Yes, we have had knockoffs of American superheroes originating in this country and presumably in other parts of the world, but they’re not natural to this environment. They’re an alien species. And I’ve thought about it and wondered why that was. And I wonder—perhaps this is being too simplistic, I don’t know, but I wonder if the root of the emergence of the superhero in American culture might have something to do with a kind of an ingrained American reluctance to engage in confrontation without massive tactical superiority. (…).

It does seem to me that massive tactical superiority might be a key to the superhero phenomenon. That, if it’s a military situation, then you’ve got carpet bombing from altitude, which is kind of the equivalent of having come from Krypton as a baby and to have gained unusual strength and the ability to fly because of Earth’s lesser gravity. I don’t know, that may be a simplistic interpretation, but that’s the way I tend to see superheroes today.

Para quem não conhece a língua do BARDO BARBUDO, em síntese O CARA disse que super-heróis são essencialmente um produto da cultura americana (fato não descaracterizado pelas esporádicas criações em outros países), e sugere uma relação entre a criação desse gênero e o posicionamento americano no cenário internacional.

Porque o teioso está carregando um homem adulto e engravatado, como o papai?

Porque o teioso está carregando um homem adulto e engravatado, como o papai?

E qual é a “chave” para entender essa relação? Ora, a América do Norte parece ter RELUTÂNCIA em encarar um conflito quando não possui uma GIGANTESCA superioridade tática em relação ao adversário, o equivalente a um CAGÃO que só entra na RINHA se for pra dar TIJOLAÇO em tetraplégico, ou só entra numa FODA se tiver certeza de que a mina nunca viu um PAU MAIOR que o dele, ou que só foi levada pra cama por caras MAIS INCOMPETENTES que ele no passado. Vide a invenção da Bomba Atômica, a demora para os EUA engajarem-se na Segunda Grande Guerra, e a invenção da Guerra Fria como uma forma de evitar confronto aberto com um oponente que, por muito tempo, parecia ser galo.

“Coincidentemente”, esse é o mesmo tipo de superioridade que os super-heróis têm em relação aos seres humanos normais. E, nesse caso, vide as paradigmáticas capa da primeira edição de Spiderman e de Action Comics (que numa melhor análise, revelam muito sobre a mentalidade fanboy).

Se o comentário do CARA MAIS FREAK de Northampton ficasse apenas no plano político, talvez não merecesse grande importância desse que vos fala. Mas logo a seguir Alan Moore faz um mea culpa e admite que era justo essa característica que o atraía ao gênero em sua infância. Ou seja, do plano político, vamos ao plano pessoal.

Então, diabos, porque os NERDS gostam tanto de super-heróis?

Ainda que hoje em dia alguns nerds (uma turma já notória por sua incrível IMPARCIALIDADE e por seu senso de adequação social, de forma que podemos confiar 100% em sua avaliação sobre o que é HYPE) afirmem que “ser nerd está na moda” e “nerd que não pega mulher é uma visão ultrapassada” (e que elas DÃO pros nerds, e OBAMA é nerd, e todo mundo tá fazendo fila pra ser nerd, etc), o fato é que a maior parte dos leitores de quadrinhos de super-heróis está na média entre 25 e 35 anos, ou seja, É GENTE VELHA, e na época em que essa turma toda estava na escola (décadas de 80 e 90), ser nerd NÃO ERA MODA ALGUMA. Na verdade, era uma grande MERDA.

Novamente, são homens adultos e engravatados que se desesperam. Nenhuma criança, nenhuma mulher ou idoso.

Novamente, são homens adultos e engravatados que se desesperam. Nenhuma criança, nenhuma mulher ou idoso. E a cachorrada?

E foi justo nessa época que esses adolescentes e crianças, hipossuficientes no trato social, se envolveram com quadrinhos, e viraram fanboys. Isso porque, como Moore sugere e confessa, eles tinham RECEIO de enfrentar os conflitos da vida, exceto numa posição na qual tivessem uma GIGANTESCA superioridade tática – o que só é possível, é claro, na FANTASIA (exceto se você for um país que arregaçou outro na Guerra Fria). Essa necessidade de enorme superioridade mal disfarça uma tremenda VONTADE DE SE CAGAR NAS CALÇAS, um grande medo de enfrentar a vida sem super-poderes.

Nada errado com isso, foi uma técnica até INTELIGENTE dessas crianças: refugiarem-se num mundo de fantasias frente à realidade que lhes parecia hostil, como o jovem Alan Moore fez e, em certa medida, esse que agora solta o verbo. O problema é quando essas crianças viram ADULTOS e ainda continuam PAGANDO PAU para super-heróis. Com esse histórico todo, seria INGÊNUO dizer que a manutenção do colecionismo (comprar revistas só para manter uma coleção, ou todas as canecas e camisetas de super-heróis) e da idolatria ao “universo” Marvel/DC por um BANDO DE MARMANJOS seja mero exercício de uma predileção pessoal. Novamente, essa história de que é só um hobbie, uma diversão, mal disfarça uma dificuldade de ENCARAR O MUNDO REAL e as mudanças. Podem dizer que tese é batida, mas talvez por isso mesmo seja mais do que verdadeira.

Ué, seria natural que, a medida em que crescessem, os fanboys fossem paulatinamente abandonando o gênero super-heróis, e mostrando-se interessados por outros gêneros de fantasia, mais sofisticados e representativos da complexidade da vida adulta. Seria, por exemplo, natural que, hoje em dia, toda aquela molecada que tremia de emoção ao ver o Wolverine tivesse sido integralmente transferida, como público consumidor, para linhas como a Vertigo. É o que uma criança fã do BAMBI ou do POKEMON faz quando cresce: procura formas mais complexas de ficção. Mas, como todos sabemos, no Brasil os títulos da Vertigo sempre tiveram problemas, como a contínua passagem dos direitos de publicação de uma editora a outra (e mostra agora a crise na Pixel), enquanto os títulos mainstream da Marvel são solidamente publicados pela Panini, E NÃO SÃO CRIANÇAS QUE ESTÃO COMPRANDO. Ou seja, não ouve a natural transferência do público.

Na verdade, o PULO DO GATO da turma do Stan Lee foi sacar que, fazendo de conta que estão escrevendo sobre temas sérios nas histórias de super-heróis, os autores podiam dar àquele bando de nerds a perfeita desculpa para não abandonarem a infância e, vias de consequência, não largarem o consumo daquelas historinhas de gente fantasiada. Os fanboys diriam para si mesmos “Uau, a namorada do homem aranha morreu, o homem-de-ferro é um pudim de cachaça! Isso é muito adulto cara! Isso é muito profundo meu! Não sou um retardado por ler isso! Os outros é que são preconceituosos e desconhecem a profundidade dessa obra de arte!” Assim, foi-se criando a cultura fanboy de “desprezar” os “não-iniciados”, isolando-se em comunidades virtuais, como forma de auto-defesa e como resultado necessário da teoria que tenta justificar a estranha situação de NINGUÉM LEVAR A SÉRIO quando o nerd diz que é um lance adulto: os outros é que não manjam nada, e que se fodam (embora em geral os nerds mijem nas calças de felicidade quando um de seus heróis vai pra telinha do cinema e vira sucesso). A gente acredita no que quer, e aceita qualquer desculpa esfarrapada quando estamos DESESPERADOS por continuar agarrados a algo. E é por isso que vemos o velho Stan com um riso irônico na cara sempre que posa para uma foto.

NADA DE ERRADO em manter um saudosismo com relação àquilo que, no passado, era tão precioso e divertido em nossa infância. Então é razoável que um adulto hoje tenha em sua casa a coleção das antigas histórias em quadrinhos de super-heróis PUBLICADAS EM SUA INFÂNCIA, ou as compre em um formato mais duradouro, como encadernados, ou que vez ou outra surja um autor que faça uma RÁPIDA homenagem ao estilo de quadrinhos que era feito naquela época. Isso porque os super-heróis da Marvel, dentro de uma perspectiva história, eram realmente MUITO A FÚ até vinte anos atrás, um lance FODÁSTICO pra qualquer homem pré-adolescente branco da classe média daqueles tempos (curiosamente, garotas e afrodescendentes parecem não ter, salvo exceções, desenvolvido nenhuma identificação com o Peter Parker ou o Steve Rogers na época). Mas continuar comprando compulsivamente toda PORCARIA que é publicada hoje em dia já revela um nível patológico: é a necessidade de manter VIVO um passado que devia ter terminado de forma decente, há muito tempo atrás.

Talvez essa dificuldade de abandonar os resquícios da infância também explique porque na maior parte dos fóruns e blogs de quadrinhos qualquer pequena discussão sempre acabe em uma grande e desarrazoada BRIGA DE FOICE E FACÃO, no qual ofensas pessoais e insinuações sobre a sexualidade alheia são a tônica (a obsessão dos membros de alguns FÓRUNS de quadrinhos por ofensas relativas à homossexualidade dos outros participantes DIZ MUITO sobre que tipo de coisa esse pessoal NÃO CONSEGUE parar de pensar). Tratam-se de crianças, que até hoje não descobriram como enfrentar um conflito onde haja paridade de armas.